TIRE O SEU RACISMO DO CAMINHO QUE EU QUERO PASSAR COM A MINHA COR. Georges Najjar Jr

sexta-feira, 20 de julho de 2018

UnB – Perfil do estudante mostra aumento de alunos negros e de baixa renda

15 anos depois da vanguarda na política de cotas, perfil do estudante da UnB comprova ampliação do acesso de pessoas negras, de baixa renda e oriundas de escolas públicas à graduação
Há exatos 15 anos, em 6 de junho de 2003, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da Universidade de Brasília marcava o nome da instituição na vanguarda da educação pública, ao aprovar a política que determinava um percentual de 20% do total de vagas no vestibular como cota para ingresso de estudantes negros na graduação. Em 2004, aconteceu o primeiro processo seletivo com essa possibilidade de acesso. Eram passos iniciais de uma cultura que resultou em uma Universidade mais inclusiva e diversificada, em todos os aspectos.
Dados levantados pelos decanatos de Ensino de Graduação (DEG) e de Planejamento, Orçamento e Avaliação Institucional (DPO) da UnB atestam que, nos últimos anos, o retrato da instituição tem se alterado pouco a pouco. Em grande parte, essa mudança reflete a diversificação do perfil socioeconômico dos ingressantes. A população negra, de classes econômicas menos privilegiadas e oriunda de escolas públicas tem se tornado cada vez maior, de acordo com dados extraídos do Sistema de Graduação (Sigra).
O fenômeno pode ser percebido, inicialmente, na opção pelos sistemas de vagas oferecidos nos diversos processos seletivos. Dos estudantes que ingressaram na UnB em 2017, 29,7% concorreram a vagas reservadas para alunos de escolas públicas – um desdobramento, a nível federal, da inovação trazida pela UnB em 2003. Destes, 11,8% eram de famílias com baixa renda (confira nos gráficos abaixo).
“Esse processo é comum a todas as universidades federais do país nos últimos anos, em maior ou menor grau”, analisa o decano do DEG, Sérgio de Freitas. O professor relata que, desde o ano passado, o decanato tem trabalhado, junto ao DPO, na consolidação e análise de informações para conhecer melhor a comunidade ingressante. Essa base norteará o estabelecimento de novas políticas de inclusão e de redução da evasão.
Grande parte dos alunos em situação de vulnerabilidade socioeconômica escolheram o Sistema de Seleção Unificada (SiSU/MEC) ou o vestibular tradicional como porta de entrada para a UnB. Na visão da pesquisadora do Observatório da Vida Estudantil Layla Teixeira, a diversificação das formas de acesso, em especial a implementação do SiSU – que considera a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) –, tem se mostrado ferramenta fundamental para a democratização da educação superior.
“A característica do Enem é ser uma prova mais analítica do que conteudística, conseguindo abarcar uma diversidade maior de trajetórias de formação escolar do que o vestibular e o PAS”, avalia.
Outros fatores são considerados quando se trata do perfil dos ingressantes, como faixa etária e sexo. A maioria (66,25%) dos novos estudantes adentraram na UnB em 2017 com idade entre 18 e 24 anos. Apesar do número de homens ser superior entre os novatos, a presença feminina quase se equipara: eles totalizam 50,76%; elas, 49,24%.

Quanto às áreas de conhecimento escolhidas pelos recém-chegados no mesmo período, vê-se a prevalência do sexo feminino nos cursos de humanas e da área da saúde, enquanto que grande parte dos rapazes preferem as graduações nas ciências exatas. “Há uma educação de gênero que direciona esses estudantes para os cursos de acordo com o que seriam as aptidões mais adequadas para o perfil feminino e masculino. Essa é outra questão que precisamos rediscutir”, acredita a pesquisadora Layla Teixeira.
MAIS EQUIDADE – Alguns fatores explicam os avanços que vêm tornando o espaço acadêmico mais inclusivo. O decano Sérgio de Freitas cita a descentralização da UnB, com a implantação de outros campi, como um dos principais propulsores para ampliar a oportunidade de acesso entre a população da capital federal como um todo. “A situação geográfica desses campi permitiu uma mudança de perfil e a descentralização da procura pela Universidade. Isso porque eles passaram a absorver a população do entorno onde estão situados”, avalia.
A Universidade também tem se mostrado mais democrática em termos de diversidade racial. Pretos e pardos ganharam mais expressividade entre os ingressantes. Dos recém-chegados em 2017, 33,53% se autodeclaravam como tal, enquanto 29,24% se identificaram como brancos.
A estimativa demonstra que, em cinco anos, houve aumento no número de calouros que se identificam como pretos e pardos e redução dos autodenominados brancos. Em 2012, eles correspondiam a 29,85% e 33,03%, respectivamente. O levantamento não permite, no entanto, identificar se pretos e pardos se tornaram maioria na UnB, tendo em vista o percentual de alunos sobre os quais não se tem informação a respeito.
Dados similares foram coletados pelo Observatório da Vida Estudantil e reforçam essa transformação. As informações deste estudo foram obtidas por meio de respostas a formulários, entregues pelos calouros durante o registro acadêmico. Os números representam, com bastante proximidade, a comunidade de ingressos e não se referem ao universo total de estudantes matriculados na instituição.
“Em 2014, mais de uma década depois da aprovação da primeira política de cotas para negros, apareceu pela primeira vez um número maior de estudantes pretos e pardos do que de brancos. Depois disso, só em 2016 esse número volta a ser maior, já como uma tendência consolidada”, observa a pesquisadora Layla Teixeira.
O decano Sérgio de Freitas enxerga a implementação da Lei de Cotas para o Ensino Superior, realizada de forma progressiva a partir de 2013, como passo decisivo para essa transição de cenário. A normativa prevê a reserva de 50% das vagas das universidades para alunos que cursaram ensino médio na rede pública. Na UnB, desse percentual, 28,5% das vagas são destinadas a pretos, pardos e indígenas. O número é calculado com base no censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a população do Distrito Federal.
Com a vigência da lei nacional, a reserva de cotas raciais da Universidade de Brasília foi reduzida de 20% para 5%, já que agora entram na conta critérios socioeconômicos. Atualmente, o total de vagas reservadas para pretos, pardos e indígenas nos processos seletivos da instituição, considerada a adoção de todas as políticas vigentes, contabiliza 33,5%.
REPRESENTATIVIDADE – Para a estudante de Comunicação Larissa de Oliveira, natural de Recife, Pernambuco, as cotas vieram garantir o sonho de estudar na Universidade de Brasília e trilhar um futuro diferente de sua família.
“Quando estavam nesta idade, minha mãe e minha vó não pensavam em terminar o ensino médio e fazer faculdade. Eu já tinha essa perspectiva, porque elas colocaram na minha cabeça e fizeram de tudo para eu ter uma educação de mais qualidade. As cotas ajudam a diminuir um pouco essa diferença da formação que tivemos”, afirma.
Para o decano Sérgio de Freitas, o exemplo positivo que o sucesso de um jovem com este novo perfil pode representar significa um impacto em grande escala. “O que, para uma determinada família, é apenas mais um profissional que se forma, para outras pode ser o único profissional que se formou, e ele vai servir de exemplo para outros jovens, os quais passarão a ver que é possível estar na universidade pública.”
O Decanato de Ensino de Graduação projeta, além da atual penetração da diversidade de perfis socioeconômicos na Universidade, resultados mais concretos dessas políticas em futuro breve. “Teremos uma sociedade muito mais igualitária e democrática. Isso irá se refletir, como em qualquer processo educativo, nas próximas décadas, com a inserção de profissionais mais qualificados em diversos extratos sociais”, analisa Sérgio de Freitas.
Foto: Beto Monteiro/Secom UnB

Advogado negro é agredido e algemado após ser impedido de usar elevador no TRT

Reprodução de câmera de segurança/TRT
A OAB/SP realizou na segunda-feira (5) um ato de desagravo em favor do advogado Flávio Cesar Damasco, que foi hostilizado e algemado por agentes de segurança da Justiça do Trabalho de SP quando tentava entrar no Tribunal para participar de uma reunião com a desembargadora responsável pelo processo de um cliente.
O episódio ocorreu no TRT da 2ª região em novembro de 2016 e está documentado em 27 minutos de imagens de câmaras de segurança da instituição, divulgadas pelo Estadão.
As imagens mostram o advogado sendo cercado por quatro seguranças e conduzido pelos braços no saguão. Um dos seguranças aparece no vídeo apontando para o rosto do advogado, ao lado de seus colegas, junto à recepção do TRT. A confusão continuou na calçada do tribunal e só terminou no 4º DP, para onde o advogado foi levado após ser algemado pelos seguranças da Corte. Na delegacia, Damasco teria sido liberado ao apresentar a carteira da Ordem.
Damasco havia passado pelo setor de identificação e estava esperando o elevador privativo quando foi abordado por seguranças. Ao ser informado que não poderia utilizar aquele elevador, dirigiu-se ao elevador público do outro lado do saguão.
Enquanto caminhava para lá, foi seguido por um vigia que não acreditou que ele era advogado. De forma inadequada, ele foi comunicado pelo homem que precisava se identificar. “O tratamento dispensado foi hostil, deselegante e mal-educado”, afirmou.
Irritado com a situação, Damasco relata ter dito ao vigia que só iria se identificar se ele pedisse com educação. Ele diz que o vigia respondeu que “não iria pedir com educação coisa nenhuma” e “se não calasse a boca, iria chamar a segurança”. Com a chegada dos seguranças, a situação saiu do controle e os ânimos só se acalmaram no DP.

DENÚNCIA

Apesar do constrangimento de que afirma ter sido alvo, Damasco não foi o autor da denúncia feita à OAB. Esta partiu de uma testemunha, o advogado Luís Carlos Moro, que diz ter acompanhado quase toda a cena sem se identificar para não influenciar os fatos.
Moro afirma ter ficado perplexo com o que viu e ligado na hora para a Comissão de Prerrogativas da OAB. Posteriormente, escreveu uma carta relatando o caso ao órgão e à Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo.
Segundo Moro, Damasco chegou a mostrar a sua carteira da Ordem aos seguranças no momento em que estava sendo conduzido à força pelo saguão, mas eles não cessaram a abordagem. Em vez disso, perguntaram por que não havia apresentado o documento antes.

RACISMO E PRIVILÉGIOS

Para o conselheiro secional e presidente da AATSP, Lívio Enescu, há indícios de racismo no episódio. “Testemunhas avaliaram que o comportamento dos seguranças não teria sido o mesmo caso o doutor Damasco fosse branco”, contou durante a apreciação o pedido de desagravo. O presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas, Cid Vieira de Souza Filho, também relatou este caso.
O caso de Damasco também deverá ser usado pela OAB para contestar no CNJ o que considera como “privilégios” da Justiça. Para o advogado Marcos da Costa, presidente da OAB/SP, não faz sentido a existência de elevadores privativos para juízes, membros do MP e servidores. Na visão de Costa “nada justifica” também a existência de uma polícia própria do Judiciário, que não se enquadra em nenhum segmento previsto na Constituição: a PF, a PM, a polícia Civil, a Guarda Municipal e as Polícias Rodoviárias.
Segundo o jurista Pedro Serrano, o fato é que um advogado de 60 anos, com idade para ser pai dos seguranças, negro, foi vítima de humilhação pública, violenta e absolutamente ilícita.
“A violência e a descortesia tanto contra advogados como com negros nesses ambientes forenses chega a um ponto de representar absoluta intolerância e ódio das instituições contra cidadãos, que, com seus tributos, ajudam a custear os elevados custos dessas instituições”, afirmou.

Olhem a resposta que o Desembargador me enviou na data de hoje:
PROAD 28403/2018
INTERESSADOS
OUVIDORIA - OUVIDORIA
Visto.
A manifestação em exame reveste-se de pouca clareza, apresentando informações que não se coadunam com a realidade, obstanto,
assim, pronunciamento deste Regional sobre as questões apresentadas.
Dê-se ciência ao interessado.
Após, devolva-se à Ouvidoria para arquivamento.
São Paulo, 22 de junho de 2018.

WILSON FERNANDES
Desembargador Presidente do Tribunal

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Por que há poucos técnicos negros? A pergunta que a Seleção do Senegal levou para a Copa. Por Sacramento

O predomínio de treinadores brancos à frente dos times de futebol, inclusive de seleções da África negra, é um fato concreto. Dos 20 clubes que disputam a primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol deste ano, apenas Roger Machado, do Palmeiras, e Jair Ventura, no comando do Santos, são negros.

Isso leva ao seguinte questionamento: por que há poucos técnicos negros em um esporte em que eles têm presença expressiva entre os atletas?
As razões não são muito explícitas. Uma matéria do The Guardian abordou o assunto em 2014, e se não chegou a uma conclusão, pelo menos jogou alguma luz em busca de respostas para a pergunta.
De acordo com o Guardian, naquele ano havia somente quatro técnicos negros ou representantes de minorias étnicas entre os 92 clubes da Premier League e da Football League, que englobam as quatro primeiras divisões do futebol inglês. O número significa menos de 5% do total. Por outro lado, entre os jogadores a presença de negros fica na casa dos 25%.
A matéria cita um estudo do pesquisador Steven Bradbury, que se debruçou sobre o tema. Uma das hipóteses que ele levanta é que o filtro racial começa ainda dentro dos campos, pelo menos nos casos dos técnicos que foram ex-jogadores. Dentre os treinadores que começaram a carreira como atletas, um bom número deles ostentou a braçadeira de capitão, posto de liderança e interlocução com a comissão técnica.
E este status, segundo Bradbury, é dado com mais frequência aos jogadores brancos, reproduzindo o estereótipo de que estes seriam mais cerebrais, em oposição aos negros, cujo destaque seria o vigor físico.
Por aqui, um dos exemplos mais emblemáticos deste fenômeno é Andrade, único técnico negro a conquistar o campeonato brasileiro de futebol, em 2009, pelo Flamengo. Mesmo com o título e o histórico no clube – volante clássico, com passes elegantes e precisos, é um dos heróis do clube rubro-negro – foi demitido no ano seguinte à conquista do título, apesar do índice de 76% de aproveitamento.
Seguiu treinando times de menor expressão, como Brasiliense e Paysandu, até decidir dar um tempo na profissão de técnico. Junto com Cristóvão Borges, ex-jogador e técnico com passagens por Fluminense e Vasco, e Lula Pereira, que treinou o Flamengo, engrossa a galeria de técnicos negros atualmente sem emprego.
Pode ser que futuramente eles voltem a atuar, e somados à entrada de novos nomes no mercado, como Roger Machado e Jair Ventura, contribuam para que as estatísticas raciais referentes aos treinadores se aproximem da realidade de dentro dos gramados.
Mas considerando que o futebol é gerenciado por homens brancos e que o posto de técnico, embora instável, seja um espaço privilegiado de poder, não dá para ter esperança de mudanças radicais neste cenário.
Caso existam, os avanços virão de forma lenta, gradual e segura, bem ao gosto dos atuais donos do poder.
Por Marcos Sacramento, do DCM 

Racismo é origem do atual formato das cidades brasileiras, dizem especialistas

A arquiteta Joice Berth lembrou que o problema começou justamente após a abolição da escravatura, no século XIX, quando foi editado o código de postura, com regras que proibiam a posse de terra por negros e uma legislação que facilitava a aquisição de terras por imigrantes europeus.

“O estruturador social é o racismo. Então, a gente tem que trabalhar a partir dele para pensar nessas desigualdades sociais que vão sendo espelhadas, produzidas e reproduzidas no espaço das nossas cidades. Não tem como a gente falar em direito à cidade, em cidades sustentáveis sem considerar as desigualdades e a raiz delas, que são o racismo e o machismo.”
A promotora de Justiça da Bahia Lívia Santana afirmou que, por falta de estrutura, a população negra nas periferias está mais vulnerável à violência e, por isso, o Estado precisa investir em equipamentos que garantam segurança, educação e lazer.
“Há necessidade realmente de se fazer uma participação ativa do Estado, mas também do cidadão. É importante que o cidadão consiga participar ativamente das decisões sobre a cidade porque elas afetam as pessoas. Então, o direito à cidade ainda é, no nosso país, por conta do racismo institucional, um direito racialmente condicionado.”
O deputado João Daniel (PT-SE) lembrou que existe uma dívida histórica no Brasil em relação aos negros e, por isso, políticas públicas de igualdade não devem sair da pauta de discussão da Câmara.
“O Brasil é um dos poucos países que fez legalmente a abolição, a libertação dos escravos, mas não fez a distribuição da terra, que é o grande problema desse país, não fez a reforma agrária, não fez a reforma urbana.”
Um caso que mobilizou os movimentos sociais foi lembrado na audiência. No início deste ano, após pedido da prefeitura de Belo Horizonte, a Justiça autorizou o despejo de Vilma Eustáquia da Silva, de 73 anos, e a demolição da casa onde ela vivia desde que nasceu. O município alega que o imóvel, comprado pelo pai dela quando trabalhou na construção de Belo Horizonte nos anos de 1920, é público.
A filha de Vilma, Heloiza Helena, esteve na Câmara e informou que o despejo foi suspenso pela prefeitura, mas em caráter provisório, enquanto a mãe for viva. Ela informou que o IPTU do terreno onde está a casa da mãe está sendo pago desde 1930, o que indicaria o direito de propriedade de Vilma.